Quando o post custa o emprego: a urgência da civilidade digital
- Luis Alcubierre
- 17 de set.
- 2 min de leitura
Vivemos uma encruzilhada digital em que a ética não pode mais ficar confinada às paredes dos escritórios nem aos códigos impressos dos manuais de conduta. O Brasil e os Estados Unidos estão testemunhando ao menos trinta demissões, suspensões ou outras punições a profissionais que celebraram ou ironizaram nas redes sociais a morte de Charlie Kirk, ativista de direita, morto depois de ser atingido por um tiro enquanto discursava em uma faculdade. Esse incidente escancara como o mundo virtual deixou de ser um território abstrato. Tornou-se uma extensão da vida real, com consequências reais, legais, reputacionais e morais.
As empresas já há muito perceberam que a conduta do colaborador nas redes sociais pode afetar não só sua imagem pessoal, mas também a da marca, do empregador, do coletivo. Por isso investem em políticas de compliance, códigos de conduta digital, treinamentos de responsabilidade sobre uso de redes. Mas esse arsenal de governança, por mais robusto que seja, frequentemente revela lacunas: ou porque não foram socializados suficientemente, ou porque não preveem casos limítrofes, ironia ou contextos culturais diversos; ou porque o indivíduo subestima o poder de alcance e permanência de uma fala online. Há ainda o fato de que, com o surgimento e a massificação das redes sociais, as marcas deixaram de ter controle total sobre sua narrativa. As percepções públicas, os compartilhamentos e as reações veiculam interpretações que escapam ao seu discurso oficial.
O empoderamento digital das pessoas trouxe benefícios. Voz, participação, denúncia, diversidade de perspectivas, mas também riscos que estamos vendo agora. A polarização se alimenta de falas extremadas, grotescas, que celebram ou ironizam tragédias. Psicólogos apontam que a empatia, a autorregulação, a reflexão antes de publicar, são competências sociais que demoram a se desenvolver; filósofos lembram que liberdade de expressão vem com responsabilização. A comunicação corporativa moderna, nesse sentido, exige não só reação. Demissões, suspensões, revogação de vistos, investigação profissional, mas também prevenção por meio de clareza ética e cultura interna que valorize a dignidade humana, mesmo quando há discordância política.
Quantas demissões mais? Quantos casos de ridículo institucional? Quantos danos reputacionais e pessoais? Precisamos aprender que o online não é uma ilha, nem uma arena à parte. Ele está totalmente entrelaçado com o offline. Quando alguém publica “parabéns ao atirador” ou “já vai tarde”, não é só um post, é uma marca de quem somos, do que a sociedade tolera ou repudia. A civilidade deveria valer em todas as esferas: dentro da empresa, na escola, em casa, nas redes, no fórum público.
É urgente que empresas reforcem a cultura da comunicação responsável, adotem treinamentos que incluam empatia, ética e impacto social. Políticas que sejam claras quanto aos limites, lideranças que não apenas respondam, mas eduquem; colaboradores que entendam que sua vida digital é extensão de sua vida real. E que cada episódio, por mais doloroso que seja, sirva não apenas para punir, mas para conscientizar. Jamais podemos nos esquecer que o respeito humano é o cimento de qualquer sociedade minimamente saudável.

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