Quando a Comunicação vira papel na novela
- Luis Alcubierre
- 13 de out.
- 2 min de leitura
Há tempos a Comunicação deixou de ser aquela área simpática, com a galera bacana que distribuía comunicados e organizava eventos. Hoje, ela senta à mesa das decisões, fala de negócios, mede reputação e, muitas vezes, é quem mais entende de gente dentro de uma organização. E isso é uma boa notícia, pelo menos até a hora em que começa a virar moda.
Na TCA, empresa central da novela Vale Tudo, o personagem Mário Sérgio (Thomas Aquino) era o dono da Comunicação, posição conquistada depois de ser demitido da agência Tomorrow, onde era diretor de Conteúdo. Até aí, nada demais. Só que o zelador da marca, o guardião da reputação, antes de morrer envenenado, envenenava a empresa usando o seu cargo para articular as maiores falcatruas em conluio com o CEO Marco Aurélio (Alexandre Nero) e seu assessor Freitas (Luiz Lobianco).
Agora, na Paladar, Maria de Fátima (Bella Campos), a ambiciosa filha da chef Raquel Acioly (Tais Araújo), se ofereceu para ser diretora de Comunicação da empresa da mãe. Segundo ela, um cargo que dispensa qualquer diploma, já que “formação acadêmica é algo antiquado”. E é nesse ponto que o humor dá lugar a uma certa preocupação, afinal, a Comunicação entrou oficialmente no rol das profissões que qualquer um acredita poder exercer, ao menos nas crônicas e nos folhetins corporativos.
Só que comunicar é outra história. A Comunicação, quando tratada de forma amadora, vira interferência. E interferência, no ambiente corporativo, custa caro. Acreditar que “quem escreve bem” ou “fala bonito” é suficiente para liderar reputação é o mesmo que achar que um bom cozinheiro pode, sem mais, virar nutricionista. É uma confusão entre talento e técnica, entre dom e método.
Comunicar não é apenas falar. É ouvir, decodificar, contextualizar. É ser radar, e não megafone. É traduzir a complexidade dos negócios para dentro e para fora, com sensibilidade, percepção, estratégia e propósito.
O humor nos ajuda a rir das distorções, e precisamos rir, sim, mas também nos ajuda a enxergar o que está por trás desses descompassos: o risco de banalizar uma das funções mais sensíveis e determinantes de uma organização moderna. Se todo mundo pode ser diretor de Comunicação, talvez ninguém esteja sendo de fato. E é aí que mora o perigo.
Que não percamos o olhar técnico, ético e humano que sustenta o verdadeiro papel do comunicador, porque a profissão não nasceu para entreter, mas para inspirar confiança, construir reputação e, acima de tudo, dar sentido às relações, dentro e fora das empresas.
Muitos dirão que se trata de ficção, mas sabemos que a comunicação é realidade, com todos os seus bastidores, tensões e responsabilidades. Ironicamente, continua sendo uma das escolhas preferidas de quem não sabe o que quer fazer na faculdade, mas acaba descobrindo, por sorte ou vocação, que comunicar é, na verdade, uma das formas mais complexas de liderar.
Quem sabe ainda me aventuro a escrever uma novelinha.

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