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O tempo de Bonner e a arte de saber partir

Ontem, ao encerrar sua jornada de quase quatro décadas no Jornal Nacional, William Bonner fez muito mais do que um simples anúncio de despedida: ele ofereceu uma lição de vida. Com seu tom sempre ponderado e uma humanidade rara no jornalismo que ele ajudou a transformar, Bonner revelou que há grandeza no ato de saber parar, de reconhecer que ciclos se encerram. E que isso não é um fim, mas uma escolha.


Desde 1986, quando assumiu a bancada do JN, William redefiniu o que significava estar à frente do maior telejornal do Brasil. Ele nunca se deixou seduzir pelo papel do "âncora opinativo" que tantas vezes vemos em outros modelos mundo afora. Sua linha era clara: o rigor do jornalismo, a verdade factual em primeiro lugar. E, no entanto, sua sobriedade se transformou ao longo dos anos. Aquele homem que parecia inalcançável nos anos 90, representando uma Globo rígida e formal, tornou-se alguém próximo, empático. Talvez tenha sido a maturidade profissional ou o próprio mundo que pedia isso, mas Bonner foi uma ponte entre a notícia e a humanidade que a acompanha. Na despedida, ficou claro que ele aprendeu a ouvir não só a audiência, mas a si mesmo.


A emoção que transbordou em suas palavras não era ensaiada. Ele deu lugar ao homem por trás da lenda. O pai que educou os filhos, o profissional que conquistou tudo o que ambicionava, o jornalista que ainda sente paixão pela reportagem. Ele se despedia do posto de editor-chefe, mas não do ofício, porque, como ele mesmo deixou antever, sua missão agora é outra. Fará reportagens especiais no Globo Repórter, ao melhor estilo Glória Maria, e trará, ao lado de antigos companheiros como Sandra Annemberg, a leveza de quem pode escolher o trabalho, e não ser consumido por ele.


Bonner lembrou que o Jornal Nacional, mesmo em seus momentos mais duros, nunca se desviou de sua bússola moral. Ainda que, vez ou outra, tenha sido alvo de críticas por vieses editoriais, o compromisso com a verdade se manteve intacto. E isso é legado. Assim como sua despedida, que mostrou que liderança é também saber preparar o terreno para quem vem depois. César Tralli terá agora a responsabilidade de estar onde Bonner esteve. E Cristiana Souza Cruz, como nova editora-chefe, assumirá a missão de conduzir um JN cada vez mais conectado ao público.


Mas, talvez, a maior lição de William Bonner ontem tenha sido sobre deixar ir. Ele mostrou que o prêmio mais valioso de uma longa carreira não é o reconhecimento externo, mas a capacidade de olhar para trás e sentir que o dever foi cumprido. Há coragem em assumir que lugares, por maiores que sejam, não precisam ser eternos. E que há vida depois deles. Talvez seja isso que a voz do Jornal Nacional nos quis dizer. Que o ciclo pode ser fechado em paz, com agradecimento, e sem nunca perder a paixão pelo que se faz. 


Agora, a história continua, mas em outro tom.



Divulgação Globo
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