Entre o braille e a bravata: o vício brasileiro de criar leis que não funcionam
- Luis Alcubierre
- 11 de jun.
- 2 min de leitura
Li na última semana, numa matéria do G1, que a Assembleia Legislativa da Paraíba aprovou uma lei obrigando o uso de braille nas etiquetas de roupas comercializadas no estado. À primeira vista, a medida parece nobre: promover acessibilidade para pessoas com deficiência visual. Mas uma análise técnica mínima revela que estamos, mais uma vez, diante de um projeto de lei tão bem intencionado quanto inexequível. E isso, infelizmente, tem sido rotina no Brasil.
A proposta ignora aspectos elementares de escala, tecnologia e até de física. O sistema braille ocupa muito mais espaço do que o alfabeto visual, o que torna inviável incluir todas as informações legais e comerciais, como composição do tecido, instruções de lavagem, tamanho, marca e país de origem em uma etiqueta de poucos centímetros. E ainda que a exigência fosse aumentar o tamanho. Além disso, não há hoje tecnologia disponível em larga escala para produzir etiquetas em braille a custos viáveis para a indústria e o varejo. É difícil imaginar que quem idealizou essa medida tenha dialogado com fabricantes, lojistas ou entidades representativas da comunidade com deficiência visual. E se o fez, não contrastou a informação em nível nacional. Fica difícil não cair no clichê da jabuticaba, até porque não existe um país no mundo que tenha criado uma lei nesse sentido.
Existem soluções reais e mais eficazes: QR Codes acessíveis que leem as informações em voz alta, etiquetas com chip NFC, aplicativos específicos. Tudo já disponível e com escalabilidade. Soluções reais, escaláveis e efetivas, sem onerar desnecessariamente as cadeias produtivas nem tratar a inclusão como fetiche legislativo.
O problema aqui não é a causa, mas a forma. Projetos assim nascem não da escuta técnica ou do estudo aprofundado, mas do desejo de marcar presença nas estatísticas eleitoreiras. É o “legislar para inglês ver”, movido por pressão de minorias barulhentas, ideologia superficial ou, muitas vezes, pura falta do que fazer.
O Brasil precisa de um Legislativo que estude antes de propor, que ouça antes de aprovar e que compreenda que boas intenções, sem técnica, geram distorções, não inclusão. Aprovar leis inexequíveis não é só improdutivo, é um desserviço à cidadania e à própria democracia, porque criam obstáculos, não soluções. E tornam a política menos respeitada, quando deveria ser exatamente o contrário.

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