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A última blindagem dos chefes sem solução

Durante muito tempo, a cultura corporativa se valeu de mitos, alguns perigosos, outros apenas ingênuos. Um dos mais nocivos é o da liderança implacável, do chefe assediador que entrega resultados “do seu jeito”; que assume para si o posto de intocável porque, ao final do trimestre, apresenta os números esperados. Ou quase isso.

Estamos falando de um modelo de liderança que já deveria ter sido extinto, mas que insiste em se perpetuar. E não é por força própria. É pelo silêncio. Pelo medo. Pela omissão de quem poderia colocar um basta nisso. É alimentado por estruturas que ainda aceitam o resultado de curto prazo como justificativa para práticas de gestão moralmente falidas.

A máscara é conhecida: são gestores que falam em “performance” enquanto desumanizam equipes, que confundem alinhamento com obediência, e que transformam uma reunião de feedback em julgamento sumário. Seus times não crescem, sobrevivem. E quando alguém finalmente sai, vai calado, sem espaço para explicar que estava sendo esmagado pela cultura do medo.

Esses líderes seguem em seus postos não porque são brilhantes, mas porque sabem jogar o jogo. Sabem entregar o que interessa e, com isso, ganham imunidade. Se protegem sob as asas de quem prefere não saber. Ou pior: sabe, mas relativiza.

Aqui, vale lembrar de Loki, o deus trapaceiro da mitologia nórdica. Inteligente, carismático e hábil na arte da manipulação, Loki não conquista pela força bruta, mas pela astúcia. Disfarçado, sedutor, convence os deuses a aceitarem o inaceitável, sempre com um discurso envolvente. Tal qual esses líderes de fachada: sabem o que dizer, quando sorrir, a quem agradar e, acima de tudo, como se esconder atrás da narrativa do resultado. São os Lokis corporativos: mestres na ilusão, perigosos na prática.

O problema não está apenas nos líderes tóxicos. Está na permissividade institucional. Está em quem fecha os olhos, em quem “passa pano”, em quem diz que “ele é difícil, mas fazer o quê?”, como se a toxicidade fosse uma peculiaridade de temperamento. Não é. É uma falha grave de conduta. Uma disfunção organizacional que compromete o presente e corrompe o futuro.

A maioria das empresas já viveu ou ainda vive esse dilema. Algumas estão, neste exato momento, protegendo seus próprios algozes. E o fazem porque ainda acreditam que “liderança é assim mesmo”. Que o preço do resultado é o sacrifício silencioso da equipe. Que a regeneração está sempre à espreita. Que todo líder merece mais uma chance.

Mas há algo que precisa ser dito com todas as letras: líder que não acredita que precisa mudar não muda. E quem protege, é cúmplice. Você deve ter cruzado com alguns. Eles sempre souberam se esconder. Sempre souberam usar o sistema. Sempre contaram com a condescendência de quem, lá no alto, confundiu agressividade com assertividade e controle com competência. O tempo lhes deu razão… até não dar mais. Porque o estrago, mesmo quando encoberto, cobra sua conta. E, quando ela chega, já não há mais cultura organizacional a salvar.

Está na hora de encerrar esse capítulo. O discurso sobre cultura, propósito, empatia, saúde mental e bem-estar não pode continuar convivendo com esse tipo de liderança sem que se denuncie a incoerência. Chega de workshops inspiracionais para o térreo e blindagem para a cobertura.

A regeneração verdadeira, das empresas, das lideranças e das relações passa, obrigatoriamente, pela coragem de tirar a máscara de quem adoece pessoas em nome de uma escalada pessoal. Não é mais possível fingir que não vemos. Porque está à vista de todos. Não se trata de caça às bruxas. Trata-se de compromisso com o futuro. E o futuro, vale lembrar, não será liderado por quem ainda acredita que medo e respeito são a mesma coisa.


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