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MTV. O fim de uma era que moldou gerações

No dia 31 de dezembro de 2025, se apagarão as luzes de uma das maiores revoluções culturais do século XX. A MTV encerrará definitivamente suas transmissões após mais de quarenta anos que redefiniram a música, o entretenimento e a forma como consumimos cultura pop. É o final de um ciclo, mas também o ponto alto para refletirmos sobre o impacto sem precedentes de um canal que começou sua jornada em 1º de agosto de 1981, ao som de "Video Killed the Radio Star", da banda The Buggles.

A MTV não foi só um canal, mas um movimento que sintetizou o espírito de rebeldia, criatividade e inovação. Foi lá que bandas como Nirvana, Pearl Jam, Guns N’ Roses e artistas como Madonna, Michael Jackson e Whitney Houston encontraram mais do que uma plataforma, encontraram um palco global capaz de transformar imagens e mensagens em histórias que conectavam gerações. Cada videoclipe era um manifesto visual e musical que ditava tendências, comportamentos e valores que soavam nos quatro cantos do mundo.

No Brasil, essa história começou um pouco mais tarde, em 20 de outubro de 1990, com o lançamento da MTV Brasil pela parceria entre o grupo norte-americano e a Editora Abril. Aqui, a MTV foi além de uma retransmissora da matriz. Rapidamente ela ganhou um tom autêntico, irreverente e debochado, estabelecendo um diálogo direto e carismático com os jovens brasileiros. Foi no calor desse ousado experimento que surgiram apresentadores memoráveis como Astrid Fontenelle, Luiz Thunderbird, Zeca Camargo, Gastão Moreira, Cazé, Marcos Mion, Sabrina Parlatore João Gordo, Edgard Piccoli, Marina Person Otaviano Costa e tantos outros, que ajudaram a criar a linguagem que unia música, comportamento e humor ácido. Apesar do sucesso e de um legado inquestionável, a MTV Brasil encerrou suas operações em 2013, quando os direitos da marca foram assumidos pela Viacom e o canal foi incorporado de forma menos impactante ao catálogo da TV paga.

O impacto da MTV transcendeu os clipes. Foi onde surgiram programas icônicos como os Unplugged, que devolveram aos holofotes a simplicidade das performances ao vivo e deram espaço para clássicos inesquecíveis como as apresentações de Eric Clapton, Nirvana e Alanis Morissette. No Brasil, os acústicos de Legião Urbana, Titãs, Cássia Eller, Paralamas e Capital Inicial viraram históricos. Os Video Music Awards (VMAs) celebraram talentos e momentos que marcaram gerações, como o beijo de Madonna e Britney Spears ou as apresentações explosivas de Lady Gaga. A MTV também foi pioneira ao abraçar a diversidade quando o tema ainda sequer era pauta. Nas telas do canal, estilos se misturavam sem preconceito: do punk anárquico dos Sex Pistols à elegância sofisticada de Bryan Ferry; do rap contestador do Public Enemy à provocação glam de Prince.

Bandas e artistas que moldaram o caminho para a pluralidade da música contemporânea devem uma parte significativa de seus sucessos à MTV. Mas não foi só a música pop que ganhou destaque. O canal abraçou provocações sociais, introduziu discussões sobre mudanças culturais no comportamento e abriu espaço para o experimentalismo, especialmente nos anos 80 e 90, quando o videoclipe ainda era uma obra de arte visual.

Contudo, o tempo, inevitavelmente, cobrou seu preço. A MTV, que durante décadas foi sinônimo de inovação, começou a perder espaço para a internet e plataformas como o YouTube, Spotify e TikTok. A geração que antes passava horas aguardando clipes na TV passava a ter o mundo no bolso, sob demanda. Para tentar se adaptar, a MTV apostou em "realities", como The Osbournes e Jersey Shore, mudando seu foco da música para o entretenimento geral. Embora esses programas tenham gerado audiência, a essência inicial do canal se perdeu. O espetáculo da música deu lugar à música do espetáculo.

A MTV, no entanto, não viveu sem polêmicas. Muitas vezes criticada por sua comercialização excessiva, falta de espaço para novos artistas em detrimento de grandes nomes e decisões editoriais controversas, o canal enfrentou críticas de jornalistas, fãs e até das próprias bandas. E quem não se lembra das noitadas críticas durante os VMAs ou de momentos em que o escândalo parecia ser tão planejado quanto os salões de clipes sofisticados?

O encerramento das operações musicais da MTV foi intensificado pela fusão recente entre a Paramount (controladora da marca) e a Skydance Media, selando o destino de canais como MTV Music, MTV 80s e MTV Live em diversos países, incluindo o Brasil. Essa decisão é um reflexo direto da transformação nos hábitos de consumo e da dificuldade de competir em um mercado saturado de conteúdo sob demanda.

Apesar do final melancólico, o legado da MTV é inegável. Foi uma escola de talentos, responsável por lançar músicos, mas também por formar apresentadores, diretores e visionários da indústria do entretenimento. Seus VJs conquistaram espaço além do canal, tornando-se referência na mídia, tanto brasileira quanto internacional. E, acima de tudo, a MTV foi testemunha e agente transformador de uma época em que música e a cultura eram mais do que produtos. Eram manifestos de identidade.

À medida que dizemos adeus à MTV, reconhecemos que ela foi mais do que uma emissora, foi uma era inteira. Cambaleamos entre a rebeldia dos Rolling Stones, o experimentalismo do Radiohead, a força de um rap poderoso e a ousadia do glitter no pop. Com o apagar dos sinais, deixamos para trás algo mais complexo do que nostalgia. Deixamos um mundo que nos ensinou a olhar, ouvir e sentir de forma diferente. A música nunca mais será a mesma. E agradecemos por isso.


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