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Entre o zero e o infinito

A vida raramente se contenta com o preto ou o branco, mas ainda assim insistimos em escolher entre dois extremos como se o mundo fosse um tabuleiro de xadrez. Essa armadilha do binário, tão sedutora em sua aparente simplicidade, nos limita. Ao acreditar que só existem duas opções, reduzimos a complexidade da existência a uma equação pobre. A matemática nos ensina que entre zero e um há infinitos números racionais e irracionais. Entre dois pontos há incontáveis coordenadas. O contínuo é a verdadeira natureza do real, e cada decisão poderia ser um espectro, não um veredito.


Na prática, porém, o cotidiano cobra respostas rápidas. Escolher A ou B parece eficiente, mas a pressa sufoca a imaginação. É o paradoxo da escolha. Quando acreditamos haver apenas duas saídas, ficamos paralisados ou, pior, aceitamos a polarização como inevitável. A teoria dos jogos e o próprio cálculo mostram que o equilíbrio se dá quando múltiplas variáveis se interpenetram, buscando pontos de Nash, onde ninguém precisa perder para que o conjunto ganhe. É nessa perspectiva que se percebe o erro de simplificar o humano a uma disputa de “sim” ou “não”.


A história política pós-Segunda Guerra Mundial é uma prova eloquente disso. O planeta se dividiu em blocos opostos: capitalismo versus comunismo, como se não houvesse matizes. Décadas de Guerra Fria alimentaram uma falsa dicotomia que custou vidas e atrasou avanços que só vieram quando novas combinações surgiram: economia de mercado com proteção social, democracia plural, integração regional. Sempre que o mundo ousou uma terceira ou quarta via, como em pactos multilaterais e políticas híbridas, a humanidade respirou um pouco mais de liberdade.


Essa lição reverbera hoje, quando o discurso político tenta nos aprisionar novamente em polos morais e ideológicos. Não existe bem absoluto nem mal eterno. Existem contextos, interesses, aprendizados e a necessidade constante de equilíbrio. A sabedoria está em recusar a pergunta rasa e propor novas. Não é fuga, é coragem intelectual de pensar além da resposta fácil.


Escolher, afinal, não é descartar o que sobra, mas integrar o que se pode criar. A vida nos oferece infinitas casas decimais de possibilidades. Reconhecer isso é um ato de maturidade coletiva. O desafio é cultivar um olhar crítico que substitua a pressa da exclusão pela arte do encontro. Um movimento que não elimina diferenças, mas as compõe, como quem transforma tensão em harmonia.


É triste perceber que tantos ainda se prendem às bordas do caminho, quando a vida inteira se oferece em cores que não cabem em dois tons.


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