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A cultura do improviso

A morte de oito pessoas em um passeio de balão em Santa Catarina, este final de semana, não é um acidente isolado. É mais um capítulo previsível de uma cultura nacional que flerta diariamente com a informalidade, a negligência e a eterna aposta no improviso. A tragédia não surpreende. Ela apenas expõe, com tintas fortes, aquilo que muitos de nós já sabemos, mas seguimos empurrando para debaixo do tapete: no Brasil, o jeitinho custa vidas.


Não é a primeira vez e, lamentavelmente, dificilmente será a última. Já vimos crianças se machucarem em parques de diversão sem manutenção, turistas virarem estatística em buggies desgovernados nas dunas do Nordeste, famílias inteiras serem surpreendidas por estradas mal sinalizadas, tirolesas com cabos frágeis, cachoeiras sem qualquer controle de acesso, crianças ficarem presas em ralos de piscinas. O que conecta todos esses episódios não é apenas a falta de fiscalização, mas uma mentalidade permissiva, onde a regra é flexível e a ética, opcional.


Vem sempre o discurso pronto: “A maioria das empresas é séria”. Pode até ser. Mas quando a consequência é a morte, de que adianta essa estatística? Quem compra um passeio, quem contrata um serviço, quem confia sua vida e a de seus filhos a um fornecedor, está disposto a brincar de roleta-russa com os “5%” que operam fora da lei? A margem de tolerância aqui não pode ser a mesma de uma compra mal sucedida em um e-commerce qualquer. Estamos falando de vidas humanas.


Esse padrão de irresponsabilidade atravessa todos os setores. Não é exclusivo do turismo de aventura. Está na prestação de serviços em geral, no atendimento relapso, na cultura da gambiarra que vai do mecânico de bairro até os corredores dos palácios. Quando quem deveria dar o exemplo escolhe o atalho, a zona cinzenta, o desvio de conduta, a sociedade inteira se acomoda nesse ciclo de mediocridade.


Enquanto seguirmos tratando segurança como custo e ética como detalhe, outras manchetes virão. Outras famílias vão chorar. O Brasil precisa, com urgência, fazer as pazes com o conceito mais básico de civilidade: a responsabilidade.

Foto: Lesly Juarez | Unsplash
Foto: Lesly Juarez | Unsplash

 
 
 

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