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Comunicação na hora errada

Há algo que distrai com insistência quando assistimos às transmissões esportivas e, curiosamente, essa sensação não nasce do desempenho dos times ou de jogadores, da atuação do árbitro ou dos tropeços da técnica ou da tática. Vem, sim, da comunicação. Ou, para ser mais exato, da comunicação feita na hora errada.

Nos jogos recentes da Copa do Mundo de Clubes da FIFA, transmitidos pela principal emissora do país, a inserção de anúncios de uma casa de apostas no meio de análises, comentários e narrações parece, no mínimo, uma decisão questionável. E aqui não se trata de um purismo romântico sobre o esporte e muito menos de uma crítica moralista ao segmento de apostas, um mercado regulado em boa parte do mundo e que atrai milhões de consumidores. Trata-se de uma reflexão profissional, estratégica e, sobretudo, respeitosa à inteligência do público.

A pergunta que não quer calar é: quem toma essa decisão? Quem, dentro da engrenagem publicitária, operacional ou editorial, define que aquele é o momento certo para interromper o raciocínio do comentarista, quebrar a linha narrativa do jogo e inserir, quase como uma pedra no sapato, um anúncio que não dialoga nem com o contexto, nem com a emoção do momento?

Será que realmente há conversão nessa abordagem? Será que, no exato instante em que um analista está destrinchando uma jogada, alguém pensa: “Oba, é exatamente agora que vou parar tudo e fazer minha aposta”? Honestamente, duvido. E falo aqui como comunicador, não como consumidor.

É curioso observar como uma estratégia de exposição de marca, quando mal calibrada, pode rapidamente transitar do território da visibilidade para o do desconforto. Não são poucos os estudos que mostram que a eficácia de uma campanha não se mede apenas pelo número de inserções ou pelo share of voice, mas, principalmente, pela capacidade de gerar conexão, relevância e aderência contextual.

Essa prática não é isolada. Quem acompanha corridas de Fórmula 1 conhece bem aquele exato momento em que, na ultrapassagem decisiva, surge uma vinheta de patrocínio que cobre parte da tela. No tênis, às vezes, o ponto crucial é invadido por uma chamada promocional.

O que parece escapar é uma lição simples, quase elementar na comunicação: “o contexto é soberano”. E se há algo que o consumidor contemporâneo valoriza é a experiência. Quando a marca rompe essa experiência de maneira brusca, desconectada, ela perde efetividade e se torna ruído.

Claro que não se trata de demonizar a publicidade, nem o modelo de negócios das transmissões esportivas. Pelo contrário. A publicidade bem feita é motor da indústria, sustenta o conteúdo, gera empregos e movimenta a economia. A questão não é estar presente, é como estar presente.

Existem soluções muito mais elegantes, inteligentes e eficazes. Modelos de branded content bem aplicados, ativações criativas que dialogam com o espírito do evento, integrações contextuais, patrocínios de quadros, conteúdos nativos que não interrompem, mas somam. O próprio ambiente digital nos ensina isso há anos: o conteúdo que engaja é aquele que entretém, informa ou ajuda.

A boa comunicação é aquela que respeita o tempo, o espaço e a inteligência do público. E, convenhamos, interromper o jogo para empurrar uma mensagem que não conversa com a emoção do momento não é apenas uma escolha ruim. É uma escolha equivocada.

Que as marcas e, principalmente, os veículos, repensem. Porque, sim, existe hora certa para tudo. E a comunicação feita na hora errada, mais do que não vender, desgasta.


 
 
 

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